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Posts Tagged ‘Jane Stanard’

helena

Recebi, a propósito do poema To Helen, de Edgar Allan Poe, cuja tradução foi publicada no final de minha entrevista ao Suplemento Literário do Minas Gerais, algumas indagações que passo a responder:

Na verdade, há DOIS poemas de Poe com o mesmo título: o primeiro, To Helen (A Helen), publicado em 1848, foi inequivocamente dedicado a Sarah Power Helen Whitman, poetisa viúva, de quem Edgar ficou noivo, não chegando a casar-se. Depois da morte do poeta, ela escreveu um livro em sua defesa, contestando as acusações que sobre ele pairavam. Esse poema (em tradução de Milton Amado) pode ser lido aqui.

O segundo, igualmente intitulado To Helen, teria sido dedicado, conforme alguns comentaristas, a Jane Stith Craig Stanard, a carinhosa mãe de um dos colegas do poeta, jovem senhora por quem ele nutria um amor sentimental. Poe tinha apenas 14 anos quando a conheceu em 1823; Jane estava com 30 e iria morrer de tuberculose um ano depois, o que levou o poeta a uma crise de desespero. Publicado inicialmente em 1831, o poema foi revisto e grandemente aprimorado em 1845 (versão usada em nossa tradução). A atribuição da dedicatória a Jane Stanard baseia-se principalmente no fato de que ela e Poe eram ambos dedicados amantes da mitologia grega e da literatura clássica.  Daí outros comentaristas alegarem que o poema, embora dedicado a Jane, não a esteja necessariamente retratando, mas que  intenta “celebrar o poder criativo da mulher”. Indicam que ele teria em parte se inspirado num poema de Coleridge (“Youth and Age”), principalmente no que respeita ao segundo verso (“Like those Nicean barks of yore”), e que, ao referir-se a Helen, poderia estar perfeitamente aludindo a Helena de Tróia, considerada a mais bela mulher da Antiguidade, esposa de Menelau, rei de Esparta, raptada por Páris, príncipe de Troia, do que resultou a Guerra de Troia, inspiradora de Homero na criação da Ilíada e da Odisséia. Assim, as velhas barcas de Nicéia seriam uma referência às embarcações de três a cinco velas que transportavam para o porto de Nicéia (cidade fundada por Alexandre o Grande nas margens do rio Jelum ou Hydaspes), os guerreiros gregos de volta ao solo nativo (Esparta) através do “mar olente” (o Mar Vermelho). As “náiades” são sabidamente as ninfas mitológicas que habitavam os cursos de água, provavelmente tomadas aqui como metáfora para ondas. Sabe-se que a Sra. Stanard era grande conhecedora da mitologia grega e comungava com o poeta dessa dedicação; talvez Poe a esteja agradecendo por havê-lo “transportado” de volta ao culto dos temas mitológicos e históricos. Psique, na mitologia romana, era uma deusa mortal que amava Cupido, o imortal Deus do Amor, e com quem manteve uma ligação secreta, noturna, pois estava proibida de ver a sua face; certa vez, não resistindo à tentação, acende uma lâmpada de óleo e a aproxima do deus. Uma gota de óleo quente caindo-lhe no rosto, faz com que ele desperte, furioso com a quebra do segredo. A menção, no poema, à lâmpada de ágata pode estar conectada a essa lenda. Finalmente, a referência final (“Holy Land”) pode sugerir tanto a Terra Santa (das Cruzadas) quanto a Terra Prometida (ou seja, aquele Éden em que, livres das convenções humanas, o poeta e sua deusa poderiam finalmente se encontrar). Transcrevemos novamente o poema e sua tradução para maior facilidade de leitura.

Jane-HelenJane Stanard (1793-1824)         Sarah Helen Whitman (1803-1878)

To Helen

Helen, thy beauty is to me
Like those Nicean barks of yore,
That gently, o’er a perfumed sea,
The weary, wayworn wanderer bore
to his own native shore.

On desperate seas long wont to roam,
Thy hyacinth hair, thy classic face,
Thy Naiad airs have broght me home
To glory that was Greece,
And the grandeur that was Rome.

Lo! in yon brilliant window niche
How statuelike I see thee stand,
The agate lamp within thy hand!
Ah, Psyche, from the regions which
Are Holy Land!

A  HELEN

Helen, tua beleza é para mim
Como as antigas barcas de Niceia
Que lentas pelo olente mar sem fim
Traziam o rude réprobo enfim
De volta à nativa areia.

Vaguei em desespero e peripécia;
Clássica a face, de jacinto a coma,
Eis que teu ar de náiade me toma
Para a glória que era a Grécia
E a grandeza que foi Roma.

Eia! De pé, à luz de teu balcão,
Vejo-te como a estátua de uma infanta
Com a lâmpada de ágata na mão
Ah! Psique que vens da região
Da Terra Santa.

(Tradução de Ivo Barroso)

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