A MI HERMANO MIGUEL
In memoriam
Hermano, hoy estoy en el poyo de la casa,
donde nos haces una falta sin fondo.
Me acuerdo que jugábamos esta hora, y que mamá
nos acariciaba: “Pero hijos…”
Ahora yo me escondo,
como antes, todas estas oraciones
vespertinas, y espero que tú no des conmigo
Por la sala, el zaguán, los corredores.
Después, te ocultas tú, y yo no doy contigo.
Me acuerdo que nos hacíamos llorar,
hermano, en aquel juego.
Miguel, tú te escondiste
una noche de agosto, al alborear;
pero, en vez de ocultarte riendo, estabas triste.
Y tu gemelo corazón de esas tardes
extintas se ha aburrido de no encontrarte. Y ya
cae sombra en el alma.
Oye hermano, no tardes
en salir. ¿Bueno? Puede inquietarse mamá.
A MEU IRMÃO MIGUEL
In memoriam
Mano, hoje estou junto ao poço da casa (*)
onde você nos faz uma falta sem fundo!
Lembro que nesta hora nós brincávamos, e mamãe
nos vinha acariciar: “Ouçam, meninos…
Então me escondo ,
como antes, todas aquelas orações
vespertinas, à espera de que você não me encontre.
Lá na sala, no saguão, nos corredores.
Depois, é você que se esconde, e não te encontro.
Lembro-me que acabávamos chorando
Irmão, naquela brincadeira.
Miguel, você, numa noite,
De agosto se escondeu, de madrugada;
Mas, em vez de esconder-se rindo, estava triste
E seu gêmeo coração daquelas tardes
Extintas se amargurou de não o achar. Já
Cai a sombra sobre a alma.
Ouça, irmão, não demore
Em se mostrar. Pois mamãe pode se afligir.
***
Este sentido poema foi escrito por César Vallejo em memória de seu irmão mais velho, Miguel Ambrósio, que morreu de pneumonia fulminante aos 26 anos em agosto de 1915. A minha tradução, na qual tomei excepcionalmente algumas liberdades, como se o poema fosse meu, faço-a em homenagem ao meu falecido irmão Ney Julião Barroso, que também morreu em circunstâncias deploráveis (operação malsucedida em 15.06.2014) e me deixou igualmente “o gêmeo coração amargurado”. À noite, quando me deito, olho para o teto na esperança de encontrar o seu esconderijo que sei estar a milhões de anos-luz, lá nas alturas. Mas nada vejo além do teto. Chamo por ele em silêncio. Queria tanto que aparecesse, que me falasse. Ney, você não sabe a falta que me faz, de ouvir a sua voz ao telefone comentando assuntos de política, preocupado com os destinos de nosso país, chamando minha atenção para a sua última crônica em seu blog ‘falandogrossodoherval’. Há quanto tempo não tenho mais você para comentar sobre a Lava-Jato, o impeachment da Dilma, as olimpíadas, as eleições no Rio e nos Estados Unidos, o Enem, a reforma do ensino, nem ouvir reclamações sobre as derrotas de seu time… Vamos parar com essa brincadeira de esconder. Já somos adultos. Nossa mãe já se afligiu bastante conosco, com as nossas estrepulias de criança e as nossas incertezas de homens feitos. Agora que somos adultos, podemos francamente trocar ideias e pedir conselhos. Mas não te acho… não te encontro… porque você se escondeu dessa maneira? INB
(*) A melhor tradução de poyo seria poial, mas não resisti diante da ilação poço sem fundo=fossa..
Poema, tradução, depoimento emocionante, Ivo. Tudo num nível de beleza que só o intensamente humano atinge.